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      FD
    • 11 setembro 2007

     # 1

    Portugal viveu uma fase (anos 80) de alguma euforia pelos painéis solares de água quente mas a sofreguidão de alguns comerciantes oportunistas levou à descredibilização do produto.

    Eduardo de Oliveira Fernandes

    Portugal depende de energia importada em quase 90%. Apenas 10% da energia primária vem de recursos endógenos: hidroelectricidade, eólica e biomassa. Aquelas só são úteis pela via da electricidade. A biomassa ainda é muito usada para a obtenção de calor ou co-geração de calor e de electricidade. E, claro, há a radiação solar.

    Portugal tem na energia solar um potencial (luz e calor) que não tem sabido utilizar. Enquanto factor ambiental, o sol é causa de amenidade climática favorável ao conforto nos edifícios sempre que a arquitectura e as tecnologias da construção sejam orientadas nesse sentido. O valor absoluto das necessidades de aquecimento, de Inverno e, em particular, de arrefecimento, de Verão, tendem a ser muito menores do que em países de climas extremos. Isto, se a arquitectura e a construção não tornarem o comportamento dos edifícios “pior” do que o do clima, conforme diz o Prof. Rafael Serra da E. Politécnica de Barcelona, isto é, mais quentes no Verão e mais frios no Inverno, como já ocorre demasiado entre nós.

    Para além das tecnologias solares passivas (arquitectura e construção inteligentes), o sol oferece outras oportunidades tecnológicas, quase todas mágicas e sofisticadas, mas de efeito muito próximo do cidadão. É o caso da iluminação natural, hoje em dia quantificavel e simulavel por modelos rigorosos – veja-se o exemplo da nova Igreja da Santíssima Trindade em Fátima – que desloca/reduz significativos consumos de energia eléctrica; da promissora produção descentralizada de electricidade por efeito fotovoltaico; e, enfim, das AQS (água quente solar) por sistemas de colectores solares apoiados ou não por electricidade ou gás natural.

    O Programa E4 – Eficiência Energética e Energias Endógenas, criado pela RCM 156/2001 de 24 de Outubro, entretanto sucedida pelas RCM 63/2003 de 28 de Abril e RCM 169/2005 de 14 de Outubro, tinha como objectivo a instalação de 150 mil m2 de colectores solares por ano e, assim, chegar a 2010 com cerca de 1 milhão m2 instalados.

    A sua obrigatoriedade nos novos edifícios, no quadro do D Lei 80/2006 (RCCTE), irá dar um impulso notável na difusão dos colectores solares, ajudando a que se estabeleçam mercados e competências técnicas qualificadas para a credibilização do produto e das tecnologias utilizadas. O INETI dispõe de infra-estrutura de certificação de painéis solares e promove cursos de formação de instaladores. Bom seria que o mercado, pudesse controlar as instalações incorrectas ou desajustadas. Portugal viveu nos anos oitenta uma fase de alguma euforia pelos painéis solares de água quente mas a sofreguidão de alguns comerciantes/instaladores oportunistas levou à descredibilização do produto durante cerca de 25 anos, com largo prejuízo para o país. Este segundo ‘round’ encontra o país melhor preparado mas, aparecem já na praça exemplos de ética comercial e profissional duvidosa a que é crucial fazer face.

    Da importância dos painéis solares de água quente falam os números: os portugueses usam em AQS mais de 20 % de toda a energia que utilizam nos seus lares ou seja cerca de 5% do balanço da energia final do nosso país.

    Esse universo de consumos de energia-calor dispersos oferece um potencial para a instalação de milhões de metros quadrados criando um mercado nacional em condições de garantia de qualidade e em moldes inovadores, associando o sol ao gás natural e/ou à electricidade e criando a prática do fornecimento do serviço de água quente por terceiros, sobretudo em casos em que se justifique (blocos de habitação, hotéis, lares, piscinas, etc.).

    A AQS é uma resposta às necessidades de aprovisionamento pela diversificação e descentralização energéticas não minimizável e dá um impulso para novos mercados de novas tecnologias e de novos serviços num valor de mais de cinquenta milhões de euros por ano com reflexos económicos e sociais, nomeadamente, no emprego.

    E é uma alavanca para uma nova consciência cívica, estimulando atitudes de tipo ‘bottom up’ de cidadãos e não de meros consumidores de uma “electricidade anónima” que tanto pode vir do carvão poluidor como da anódina eólica. Em sintonia com o Plano da Certificação Energética e Ambiental dos Edifícios, lançado em Julho de 2007, sob a liderança da ADENE, a AQS é, porventura, o vector de política energética mais eficaz na promoção da mudança cultural em prol do ambiente que se iniciou com o respeito pelo uso da água, prosseguiu com a crescente consciência ambiental, desde o ruído à separação dos resíduos, e se deseja que se traduza numa atitude de responsabilidade pela energia expressa em comportamentos de eficiência e de respeito pelos recursos energéticos próprios ou endógenos, nomeadamente, pelo sol.
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    Eduardo de Oliveira Fernandes, Professor da FEUP
    http://diarioeconomico.sapo.pt/edicion/diarioeconomico/opinion/columnistas/pt/desarrollo/1032988.html
 
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