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    • 23 março 2009 editado

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    Vendedores
    Quem tem pressa está condenado a baixar o preço do imóvel
    20.03.2009 - 07h33 Luísa Pinto
    Primeiro cola-se o número de telemóvel na janela mais visível da casa. Depois tiram-se as melhores fotografias para colocar na Internet.

    Avisam-se amigos e conhecidos, e espera-se que o telefone toque. Os primeiros a ligar quase nunca são potenciais interessados em comprar a casa: as agências imobiliárias estão atentas ao mercado e não deixam escapar novas ofertas. As visitas de clientes são recebidas com uma ansiedade indisfarçável. “Será que é desta?”

    Há aqueles que passam o fim-de-semana a ver casas por desporto, que nem ligam ao chão de mármore bem cuidado, ou à varanda ampla com vista para o jardim. Outros torcem o nariz com a casa de banho sem janela e vão-se embora sem dizer uma palavra. O proprietário exaspera-se. Antes de abrir a porta, tinha feito a cama à pressa, puxado as persianas e lavado a loiça que ficou esquecida na cozinha.

    “Vender casa é uma seca e é difícil. O mais frustrante é receber as pessoas em casa e depois não ter qualquer resposta. A maior parte, nem um comentário fazem”, diz Patrícia (nome fictício) que há dois anos tenta vender o seu T2 na Charneca de Caparica. A crise do “subprime” nos Estados Unidos ainda não era uma preocupação quando Patrícia decidiu que era altura de trocar de casa. Com um filho de um ano e outro a caminho, precisava de mais espaço. Tem a casa em quatro imobiliárias e o preço que propõe já está muito abaixo do investimento inicial, feito em 2006 (125 mil euros): 95 mil euros. “Há quatro meses encontrei uma pessoa que está a vender uma casa que me interessa. Vamos fazer a troca, mas sem permuta. Agora estamos dependentes da avaliação do banco”, conta a educadora de infância de 28 anos.

    Baixar os preços

    Vender é quase sempre um processo complexo, mas em tempo de crise significa estar no lado mais fraco. Descer o preço é a alternativa com mais resultados quando se quer acelerar a transacção. E a verdade é que a tão falada desvalorização dos imóveis está muitas vezes relacionada com a necessidade dos proprietários de vender rapidamente, diz João Cunha, administrador da Square. Por outro lado, “quando se vive um clima de grande falta de confiança, é natural que os compradores queiram manter um nível de conservadorismo mais elevado nas suas propostas negociais”, acrescenta.

    É o preço que atrai potenciais compradores, refere Jorge Garcia, director de comunicação da ERA. “Hoje a análise [do preço] terá de ser feita com muito maior prudência e profissionalismo. Depende da necessidade casuística de ajustamento da oferta à procura. Há zonas e casos em que os preços face a períodos homólogos nos dois últimos anos tiveram ou têm de baixar 20 por cento”, continua. Em áreas com excesso de obra nova por escoar “é impensável vender usado se os preços não se ajustarem em baixa muito significativamente”.

    Paulo Santos demorou mais de um ano a vender uma casa na Aroeira, que estava a tentar ser comercializada por 20 imobiliárias. Fartou-se de gerir contactos e criou um “site” onde disponibilizou as fotografias. “É um processo que pode ser desgastante e negociar directamente com o proprietário é mais fácil”, justifica. Vendeu a casa mas manteve a página porque “é uma forma de dar algo de volta à comunidade”. Um dos dez particulares que colocaram anúncios foi Armando Vilela, 40 anos, cuja experiência como vendedor é “muito curta”. O seu T3 em Alverca está a ser comercializado há apenas três semanas por 120 mil euros negociáveis. E por dever pouco dinheiro ao banco do empréstimo que contraiu há 15 anos tem a tranquilidade necessária para conseguir sair satisfeito da negociação (a casa custou cerca de 54 mil euros). Quando falou com o PÚBLICO já tinha recebido várias visitas. Um dia depois da entrevista, encontrou comprador.

    “Calculo bem os passos que dou e neste momento até estou a ser um pouco oportunista com a crise. Para mim quero 110 mil euros, o restante é para a imobiliária”, conta. Foram cerca de dez as empresas que quiseram intermediar a venda. Consciente das dificuldades do mercado, Armando recusou propostas de exclusividade e contactou directamente agências para que o ajudassem a concretizar o negócio. “Não tenho prazos para vender. Estou com calma e sem stress”, dizia. Foi talvez a tranquilidade com que mostrou o andar aos potenciais compradores que ajudou a avançar o processo, muito mais depressa do que tinha planeado. Os interessados já estão no banco a pedir formalmente o crédito à habitação. E é aqui que, hoje, estão os principais obstáculos (ver texto da página o lado).

    No último trimestre de 2008 o volume de vendas não concretizadas pela ERA (120 mil imóveis em carteira) devido à não concessão de empréstimos passou de até cinco por cento para entre cinco e dez por cento. Na Century 21 (5322 imóveis em exclusivo) duas em cada dez vendas deixaram de ser feitas pelos mesmos motivos, um cenário que não era tão expressivo antes da crise.

    Ajustar a casa à carteira

    Armando Vilela vai comprar uma casa nova, maior e com garagem. “No máximo devo pedir 80 mil euros ao banco. Já fui ao meu balcão fazer uma simulação e consigo o mesmo “spread” que tenho actualmente, de 0,6 por cento”, afirma. A sua estratégia de amortizar o primeiro empréstimo sempre que podia resultou. “No tempo das vacas gordas não me deixei iludir. Sempre renegociei o ‘spread’ e o dinheiro do IRS era para amortizar e não para viajar”, esclarece.

    Na decisão de vender uma casa entram vários factores, sobretudo, acontecimentos como o nascimento de um filho, um divórcio ou um novo emprego. As imobiliárias contactadas pelo PÚBLICO admitem que, agora, entre os seus clientes há quem tenha dificuldades em pagar a prestação bancária. Outra tendência que nasceu com a crise é a necessidade de optar por uma casa menos dispendiosa. “As famílias procuram ajustar os seus encargos financeiros ao novo nível de rendimentos transferindo-se para um imóvel de menor valor”, revela João Cunha, da Square.

    As dificuldades estendem-se aos construtores. Estima-se que haja 450 mil imóveis para vender em Portugal (ver texto principal) e pequenos empreiteiros como José Vitalino Fernandes não conseguem rentabilizar o investimento. “As pessoas não têm dinheiro. Vêem as casas mas não fazem negócio”, lamenta o empresário algarvio que tem várias moradias para venda em Loulé.

    Na esperança de conquistar mais clientes, há promotores que oferecem automóveis ou lançam campanhas de permutas de casas novas por usadas. A forma de fazer negócio está a mudar. Mas há unanimidade quando se pergunta se esta é uma boa fase para vender. A não ser que tenha amortizado as dívidas, o melhor é esperar por dias melhores.

    Ana Rute Silva

    Dicas para vender

    Como refere Jorge Garcia, da ERA, “cada imóvel para venda é um produto que tem um plano de marketing único”. E como todos os investimentos, tem de ser ponderado em função do retorno.

    Se a casa tem mais de 15 anos verifique o estado das canalizações e sistema eléctrico. Se tiver feito um investimento recente e comprovado refira isso ao potencial comprador.

    Não faça obras de fundo. Vai encarecer o preço do imóvel e pode não ter o retorno desejado. Para além disso, o futuro proprietário pode ter um gosto muito diferente do seu.

    Arrume a casa antes de cada visita. E não deixe fotografar camas por fazer ou quartos desarrumados. “A fotografia é o primeiro cartão de visita”, diz Sérgio Serra, um dos sócios gerentes da Home Smile do Laranjeiro, Almada.

    Se a casa tem boa exposição solar prefira visitas durante o dia

    Se tiver tempo, tenha flores frescas na entrada da casa. O cheiro de um bolo acabado de fazer pode ajudar a transmitir uma ideia de conforto.

    Disfarce o ruído com música ambiente ou televisão ligada.

    Se é fumador, areje a casa antes da visita.

    Especial Suplemento Economia

    http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1369948&idCanal=57
 
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