Colocado por: laivortSim, a questão põe-se exactamente com a afixação "publica" num espaço comum dentro do prédio,....
Parecer da Comissão Nacional de Protecção de dados:
Deliberação nº 49 /2004
I. Os factos e o pedido
L… solicitou, em 7 de Janeiro de 2004 , a intervenção da CNPD por entender que a administração de condomínio do prédio onde reside estar a divulgar «publicamente alguns dos seus dados pessoais». Efectivamente, no hall de entrada do prédio era afixada «uma listagem onde consta o nome completo, a morada e o estado de pagamento das quotas do condomínio».
Alega que nunca autorizou que os seus dados fossem publicados em local público, tendo solicitado a cessação de tal procedimento de afixação, no referido local.
A empresa que administra o condomínio – Forum Condominium, Administração de Condomínios, Unipessoal, Ld.ª - refere o seguinte:
O hall do prédio «é um local de acesso privado aos condóminos aí residentes, os quais para entrarem no prédio terão que ter um código de acesso, chaves ou comando para o efeito»;
Os únicos dados que são apostos «são o nome, a fracção e as quotas pagas ou em débito em relação às contas gerais do prédio, que todos os condóminos têm direito de conhecer e consultar»;
O condómino em causa «não solicitou à nossa empresa a não afixação daquelas informações, pelo que não pôde ser considerado tal pedido»;
Alguns condóminos do bloco 11 solicitaram, expressamente, que na listagem ficasse a constar, tão só, a fracção com quotas em atraso, o que passou a ser feito, a partir dessa data;
Tal procedimento deriva de «solicitação da maioria dos condóminos aí residentes, os quais visam, por um lado, conhecer o valor das quotas a pagar, como o estado das contas do condomínio, a que todos têm direito»;
Acrescenta, ainda, que “em assembleia de condóminos foi sugerida esta afixação, o que a administração está a cumprir”.
Feita nova insistência da CNPD junto da administração do condomínio informou o seguinte:
Existe um projecto de Regulamento, ainda não aprovado;
“Quanto à sugestão de afixação, sempre se falou no assunto apesar de não constar expressamente da acta, mas só nesta última a contrario ”;
A acta número doze – relativa à reunião de condóminos realizada em 26/1/2004 – a assembleia de condóminos consignou, no âmbito de «assuntos de interesse geral» , o seguinte: «foi falada a situação de, a partir desta data, passar a figurar no mapa de quotas tão só as fracções ao invés dos nomes dos condóminos, à semelhança do que sempre sucedeu com o prédio n.º 11» .
II. Apreciação
1. A questão que se coloca no caso em apreço é a de saber se será legítimo, à luz da Lei 67/98, de 26 de Outubro, afixar o nome, a fracção e o valor das quotas em atraso. Importa, ainda, apurar se o facto de ser omitido o nome do condómino da listagem tem relevância em termos de protecção de dados.
A Lei 67/98, de 26 de Outubro, é aplicável ao «tratamento de dados pessoais por meios total ou parcialmente automatizados, bem como ao tratamento por meios não automatizados de dados pessoais contidos em ficheiros manuais ou a estes destinados» (cf. artigo 4.º n.º 1 da Lei 67/98).
O conceito de tratamento que nos é dado pelo artigo 3.º alínea b) da Lei 67/98 é amplo e nele se englobam as operações sobre dados pessoais efectuadas, com ou sem meios automatizados, tais como “a recolha, registo, a organização...a comunicação por transmissão, por difusão ou por qualquer outra forma de colocação à disposição”.
Quer haja a divulgação do nome ou, tão só, da fracção, estamos perante dados pessoais na medida em que – à luz do artigo 3.º al. a) da Lei 67/98 – integra-se no conceito de dados pessoais «qualquer informação...relativa a pessoa identificada ou identificável». Será «identificável» a pessoa que possa ser identificada. Ora, através da identificação da fracção é facilmente identificável o respectivo proprietário, ainda que tenha que se recorrer à informação constante do registo predial (a qual é facilmente acessível).
Encontrando-se a informação estruturada numa listagem (cf. artigo 3.º al. c) da Lei 67/98) e por aplicação das disposições precedentes, estamos perante um tratamento ao qual é aplicável a Lei 67/98.
Não há dúvida que a informação tratada é necessária, adequada e não excessiva à finalidade da administração e gestão da actividade do condomínio (cf. artigo 5.º n.º 1 al. c) da Lei 67/98, de 26 de Outubro). A grande dúvida que se coloca é a de saber se é legítimo o tratamento – na vertente de «divulgação» ou «difusão» – das quotas dos condóminos.
Deve salientar-se, em primeiro lugar, que a afixação de dados no hall de entrada não consubstancia uma difusão em «local privado», no sentido de ser acessível apenas aos condóminos. Efectivamente, o hall de entrada é frequentado por muitas outras pessoas, para além dos condóminos: arrendatários, pessoas que visitam o prédio pelos mais variados motivos, pelos diversos fornecedores ou prestadores de serviços que são chamados pelos condóminos. Não podemos, portanto, aceitar que a referida listagem é apenas acessível aos condóminos.
Acresce, por outro lado, que os condóminos sempre podem contactar a administração quando pretendam saber qual a situação de cada condómino em termos de pagamento das quotas.
Não podemos ignorar que, em muitos casos, a razão que está subjacente a tal divulgação pública da qualidade de devedor tem em vista levar esse condómino a liquidar a dívida, em face da publicitação da sua qualidade de devedor.
Em matéria de legitimidade o artigo 6.º da Lei 67/98 admitirá a difusão de dados, nomeadamente, quando houver consentimento dos titulares (corpo do preceito), quando tal difusão resultar de disposição legal (alínea b) ou quando essa difusão decorrer de «interesses legítimos do responsável pelo tratamento ou de terceiros a quem os dados sejam comunicados, desde que não devam prevalecer os interesses ou os direitos, liberdades e garantias do titular dos dados» (alínea e).
2. Verifica-se que, já depois da queixa, a assembleia de condóminos se pronunciou sobre a possibilidade de divulgação de dados dos devedores de quotas – com indicação da fracção – sem que tal assunto constasse da ordem de trabalhos. Efectivamente, tal assunto foi tratado na rubrica «assuntos de interesse». Será, por isso, de duvidosa legalidade e força vinculativa tal decisão.
O queixoso pode, através dos mecanismos de impugnação das deliberações das assembleias de condóminos, fazer valer os seus direitos e ver anulada tal decisão (cf. artigos 1432 e 1433 do Código Civil).
3. Mas, independentemente da utilização do mecanismo de impugnação de deliberações, será que a CNPD pode intervir em matéria de divulgação destes dados?
O artigo 35.º da Constituição delimita os princípios fundamentais em matéria de utilização da informática e tratamento de dados pessoais, estabelecendo o n.º 2 que «a lei define ...as condições aplicáveis ao tratamento automatizado, conexão, transmissão e utilização» de dados pessoais.
Ora, em termos de «legitimidade do tratamento» as respectivas condições (aí se incluindo a difusão de dados) só podem, no caso concreto, decorrer de consentimento ou de disposição legal, já que não parece à CNPD que o interesse na divulgação se possa sobrepor aos direitos dos titulares dos dados (os devedores de quotas do condomínio).
Não se tendo provado que haja consentimento/aprovação de todos os condóminos importa saber se à luz da lei se deve entender – especialmente em sede de protecção de dados – que os condóminos podem condicionar os direitos dos restantes titulares dos dados().
Conforme decorre do artigo 2.º da Lei 67/98, o tratamento de dados pessoais deve processar-se de forma transparente e no estrito respeito pela reserva da vida privada, bem como pelos direitos liberdades e garantias. Por seu turno, o artigo 5.º estabelece que os dados pessoais devem ser «tratados de forma lícita e com respeito pelo princípio da boa-fé» (alínea a) e «recolhidos para finalidades determinadas, explícitas e legítimas, não podendo ser posteriormente tratados de forma incompatível com essas finalidades» (alínea b).
A CNPD entende que é violadora do direito à privacidade e do bom nome a decisão dos condóminos que, em violação dos princípios de protecção de dados, consideraram que os dados pessoais dos devedores de quotas devem ser afixados no hall do prédio(). A recolha de dados por parte da administração não foi feita com esta finalidade e qualquer desvio da finalidade carece da autorização da CNPD (cf. artigo 23.º al. c) da Lei 67/98). Neste contexto, o direito de oposição dos titulares dos dados é legítimo (cf. artigo 12.º alínea a) da Lei 67/98).
Acresce, por outro lado, que a lei já estabeleceu mecanismos expeditos para a execução das quotas ao conferir força de título executivo à acta relativa a dívidas por encargos que satisfaçam as condições estabelecidas no artigo 6.º do DL 268/94, de 25 de Outubro.
Em face do exposto, entende a CNPD que a empresa que administra o condomínio – Forum Condominium, Administração de Condomínios, Unipessoal, Ld.ª - deve, depois de assegurar o direito de informação dos titulares dos dados (cf. artigo 10.º da Lei 67/98), omitir da listagem as fracções que exercerem o direito de oposição em relação a este procedimento.
De qualquer forma, o tratamento destes dados deve ser objecto de notificação à CNPD, nos termos do artigo 27.º da Lei 67/98.
Lisboa, 9 de Março de 2004
Amadeu Guerra (relator)
Alexandre Pinheiro
Luís Durão Barroso
Eduardo Campos
Ana Luísa Geraldes
Luís Lingnau da Silveira (Presidente)
Colocado por: adiasnão é difamação...
Colocado por: laivortLembro-me por exemplo de situações que ate apareceram nos noticiários há não muito tempo, em que os donos de lojas afixavam os nomes dos devedores em plena vitrina.
Colocado por: laivortMais recentemente até o estado optou por essa opção colocando a lista dos devedores ao fisco online.