Iniciar sessão ou registar-se
    •  
      FD
    • 23 março 2009 editado

     # 1

    Ana Rute Silva

    A atitude das imobiliárias e dos potenciais compradores mudou. Hoje não se visita uma casa sem antes ir ao banco. E ter fiadores já não significa crédito garantido. Por mais paradoxal que pareça, para comprar é mesmo preciso ter dinheiro.
    O inquérito aos bancos sobre o mercado de crédito do Banco de Portugal, feito no último trimestre de 2008 e divulgado em Janeiro, confirma a restrição nos critérios de aprovação de empréstimos a particulares para compra de casa. Maior exigência traduziu-se em "spreads" mais elevados e os cinco bancos inquiridos prevêem uma diminuição da procura nos primeiros três meses do ano.
    Sem adiantar números concretos, o Millenium bcp admite que o aumento do custo do dinheiro e um maior rigor na concessão de empréstimos levaram à descida do volume de Crédito Habitação desde Fevereiro. Nessa altura, o banco praticava um "spread" mínimo de 0,6 por cento e máximo de 2,8 por cento.
    BCP, Santander, BES, BPI e Caixa Geral de Depósitos estão a praticar margens de lucro que variam entre os 0,6 e os 3,3 por cento. Por exemplo, em Fevereiro de 2008 o Santander tinha um "spread" mínimo de 0,29 por cento e máximo de 1,95 por cento. Hoje oferece entre 0,7 por cento e 2,4 por cento.
    "A negociação com as instituições financeiras passou a ter um crivo inicial muito mais selectivo", diz Jorge Garcia, director de comunicação da ERA. Ao contrário do que sucedia antes do colapso dos mercados, as imobiliárias passaram a avaliar melhor a capacidade financeira dos potenciais compradores.
    "Hoje o desafio não é negociar com o banco o empréstimo, mas sim seleccionar e negociar bem a casa que se vai comprar para que esteja enquadrada com as necessidades e capacidades financeiras do cliente", afirma Ricardo Sousa, administrador da Century 21. João Cunha, da Square, também garante investir "bastante no processo de qualificação dos clientes".

    Atraídos pela descida da taxa Euribor
    À Home Smile do Larajeiro, em Almada, chegam muitas pessoas atraídas pelas notícias da descida histórica da Euribor, que regista quedas desde Setembro do ano passado (no dia de fecho deste artigo a taxa de juro interbancária a três meses atingiu os 1,602 por cento e a de seis meses 1,175 por cento). "As pessoas acham que é boa altura para comprar. É para quem tiver dinheiro. Os restantes chegam aos bancos e confrontam-se com os 'spreads' altos", diz Sérgio Serra, um dos sócios gerentes.
    Ter um "spread" de um por cento é bom, numa freguesia onde o valor médio de transacção é 120 mil euros. "Tentamos encontrar uma casa com um preço inferior ao que o candidato pode comprar para que o processo não caia", revela.
    Nuno Roque, operador de manutenção, 27 anos, é um cliente da imobiliária e está à procura da primeira casa. Antes de começar a ver imóveis foi ao banco. Só pode comprar um T2 por 100 mil euros. Há um ano atrás sondou o mercado e encontrou casas com as mesmas características, e na mesma localização, por mais dez e 15 mil euros. "Entretanto já encontrei a casa que quero e foi uma boa oportunidade. Vou pedir 100 por cento do dinheiro, com fiador", diz, confiante. Se Nuno Roque conseguir financiamento da totalidade será uma excepção. O banco não colocou obstáculos, mas a avaliação da casa é decisiva. E essa, diz Sérgio Serra, depende muito do perfil do comprador.
    "Hoje valoriza-se mais a capacidade de pagamento e os capitais próprios iniciais do que a garantia prestada, que foi uma componente muito forte no passado", diz João Martins, director-geral da consultora financeira Maxfinance. O negócio da empresa, criada em Abril do ano passado, está a beneficiar com a crise: face às dificuldades em obter crédito, há mais pessoas a precisar de ajuda para perceber até onde podem ir financeiramente.
    Segundo um estudo da Basef Banca, da Marktest, há 2,1 milhões de famílias com empréstimo à habitação. Ana Marta Pereira, 27 anos, juntou-se à estatística há duas semanas depois de ter feito a escritura da primeira casa, na Ericeira. "O meu limite eram 120 mil euros. Fui a vários bancos e uma das coisas que me pediram logo foi fiadores", conta a engenheira química.
    Tentou morar em Lisboa mas o preço e o mau estado das casas travaram os planos. "Tive de alargar horizontes por questões monetárias", explica. No banco conseguiu um spread de 0,6 por cento para um empréstimo de 100 mil euros, pagos em 50 anos. Não sentiu dificuldades na negociação com a banca.

    Leilões de imóveis penhorados em alta
    Ricardo Sousa sublinha que esta é uma boa altura para comprar. E repete que os preços de mercado estão mais baixos pela urgência das pessoas em vender. As oportunidades estão unidas ao azar dos proprietários. A DECO diz, por exemplo, que o negócio dos leilões de imóveis penhorados "anda de vento em poupa". Um casal comprou um T3 duplex no Montijo por 122 mil euros, menos 40 por cento do valor patrimonial tributário.
    Com os bancos a apertar critérios, as imobiliárias apostam nas parcerias directas com as instituições bancárias ou empresas como a UCI (União de Créditos Imobiliários), uma "joint-venture" entre o Santander e o BNP Paribas criada em 1999, e especializada na concessão de crédito através de mediadores imobiliários. A empresa não se mostrou disponível para revelar números do negócio.
    Quem compra hoje prefere tipologias mais baixas, adequadas à sua capacidade financeira. Ainda assim, os portugueses, como diz Ricardo Sousa, "têm uma cultura de proprietários".

    http://jornal.publico.clix.pt/default.asp?url=noticias.asp%3fa%3d2009%26m%3d03%26d%3d20%26sid%3d0%26id%3d299640
 
0.0095 seg. NEW