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  1.  # 1

    Amigos,

    Fiz um contrato promessa compra e venda com uma empresa de compra e venda de imoveis, estou arrependido de o ter feito pois são tipos de escrupulos. Face ao exposto eu pretendia anular o Contrato, pois a minha mãe é usufrutuaria e já não se encontra nas devidas condições de saude, quer fisicas quer mentais e como tal já não consegue assinar tem que colocar o dedo, na altura os prometentes compradores chamaram uma advogada ao meu imovel para autenticar as assinaturas, porem a minha mãe colocou o dedo no contrato a pedido da mesma. Agora pergunto, face à situação a Advogada tem competencia para aferir se a minha mãe tinha condições para aprovar o Contrato atrvés do dedo, eu numa situação destas tinha que ser um notário a verificar essa situação?

    Obrigado a todos
  2.  # 2

    Meu estimado, a matéria ora suscitada tem-se opor demais complexa e delicada para, de forma eficiente, ser-lhe prestada a devida, exigida e melhor razão. No entanto, e sem pretender induzi-lo em erro, possa ressalvar que uma das soluções passa pelo regime da interdição (vide aqui), cujo enquadramento legal se tem lavrado no sosso código civilista (vide aqui).

    Ora, um dos casos de incapacidade negocial do exercício é a interdição, instituto que tem por escopo a protecção do próprio interdito, enquanto maior que, por anomalia psíquica (o que abrange deficiências do intelecto, da afectividade ou da vontade), surdez-mudez ou cegueira, levam, pela sua gravidade, à inaptidão para reger a sua pessoa e bens (cfr. art. 138º do CC). No que às primeiras concerne, cabem não apenas um descalabro demencial propriamente dito, isto é, uma psicose adquirida, como igualmente a psicose congénita, ou seja, os chamados estados oligofrénicos (cretinismo, idiotia, imbecilidade), em que a pessoa nunca chegou a atingir o desenvolvimento normal.

    Temos, contudo, de estar em face de deficiências habituais ou duradouras – se passageiras, embora graves, não relevam, ainda que a habitualidade não pressuponha uma continuidade absoluta – e actuais – têm de existir, não bastando uma anterior enfermidade ou exame médico, ou ainda que se torne de recear. Mas caso a anomalia psíquica se traduza numa simples fraqueza de espírito do incapaz, então estaremos perante uma eventual situação de inabilitação do incapaz.

    Como tal, e na medida em que seja decretada, apenas abrange os actos de disposição entre vivos e aqueles que forem especificados na sentença, consideradas as circunstâncias concretas do caso (cfr. art. 153º do CC), podendo mesmo ser retirada a administração dos próprios bens e entregue a um curador (cfr. art. 154º do mesmo diploma legal).

    No que concerne o valor dos actos praticados pelo interdito, importa distinguir três momentos essenciais:
    1) se posteriores ao registo da sentença de interdição definitiva (cfr. art. 1920º-B do CC, aplicável ex vi do art. 147º do mesmo diploma legal, al. g) do nº 1 do art. 69º e art. 78º do Código de Registo Civil), estamos perante actos anuláveis, vício invocável nos termos do art. 125º, aplicável ex vi art. 138º do CC (cfr. art. 148º do CC);
    2) se praticados na pendência do processo de interdição, isto é, entre a publicação dos anúncios previstos no art. 945º do Código de Processo Civil e o registo da sentença de interdição definitiva, serão anuláveis se considerados prejudiciais numa apreciação reportada ao momento da prática do acto (cfr. art. 149º do CC e nº 2 do art. 956º do CPC);
    3) já os actos praticados antes da publicidade da acção, há que atender ao disposto relativamente à incapacidade acidental (cfr. art. 150º do CC).

    Esta terceira será porventura a que lhe aproveitará, porquanto a incapacidade acidental, prevista e regulada no artigo 257º do CC, exige, para a anulabilidade do acto, que, no momento da prática do actos, haja uma incapacidade de entender o sentido da declaração negocial ou falte o livre exercício da vontade; e que a incapacidade natural existente seja notória ou conhecida do declaratário (passível de apreensão por uma pessoa média, colocada na posição do declaratário), assim se tutelando a boa-fé deste último e a segurança jurídica.

    Por outro lado, não bastará demonstrar um estado habitual de insanidade de espírito na época do negócio, tornando-se antes necessário provar a existência de uma perturbação psíquica no momento em que a declaração de vontade foi emitida. Por último, e no que tange ao regime da anulabilidade, há que lançar mão do disposto no art. 287º e ss. do CC, ou seja, terá legitimidade para requerer a anulação do acto a pessoa que se encontrava em situação de incapacidade ou, caso o haja, o seu representante legal, o que poderá ser feito no prazo de um ano a contar da cessação da incapacidade, se o negócio já tiver sido cumprido, ou, na hipótese contrária, invocada a todo o tempo, por via de acção ou de excepção”.

    Sendo assim, o que importa saber é se a senhora sua mãe, à data da outorga do contrato promessa de compra e venda em discussão, se encontrava ou não incapacitado de entender o sentido da declaração negocial que por si foi proferida (a promessa da venda de um imóvel próprio, pelo preço dito acordado e por ele já eventualmente recebido sinal) e se tal incapacidade era notória ou conhecida dos declaratários (o promitente comprador e a advogada), devendo entender-se como incapacidade notória aquela que uma pessoa de normal diligência poderia logo notar.

    Sobre esta questão, e a propósito do valor dos actos praticados pelo demente antes de ter sido requerida a sua interdição e publicado o facto pelos meios legais, havendo posterior decretação da sua interdição, expunha o Prof. Manuel A. Domingues de Andrade, in “Teoria Geral da Relação Jurídica”, vol II, 4ª reimpressão, a pgs. 89/90 (a propósito do CC de 1867 e do artº 954º, nº 1, do CPC de 1939): “…a demência pode ser evidente porque o demente dá mostras bem claras dela e contudo não ser geralmente conhecida. É o caso de o demente viver dentro de um limitado círculo de pessoas que não divulguem o facto. A demência será evidente, por hipótese, mas só essas pessoas a conhecem. Por outro lado, a demência pode ser geralmente conhecida e não ser evidente. É o caso de o demente raras vezes dar sinais da sua anomalia e, no entanto, as pessoas que com ele convivem espalharem o facto, que por isso mesmo se torna geralmente conhecido. Isto posto, qual será o verdadeiro sentido da lei?

    Segundo a interpretação (dita actual) seguida, será notória a demência quando geralmente conhecida. A parte que argui a nulidade só terá a provar que ao tempo, isto é, na época do negócio, já existia a demência, sendo também notória ou conhecida do outro estipulante. Não carece de provar que o demente não estava num intervalo lúcido.

    Mas não se segue daí que só dados aqueles factos possa ser anulado o negócio, nem que, dados eles, a nulidade seja inevitável. Se a demência não era notória ou conhecida da outra parte, pode todavia o negócio ser anulado provando-se que no momento da sua conclusão subsistia e vigorava o estado demencial. Se a demência era notória ou conhecida da outra parte, pode esta arredar a nulidade provando que naquele momento se verificava uma pausa no estado demencial – um intervalo lúcido.

    Verifica-se, portanto, que a notoriedade da demência – ou o seu conhecimento pela contraparte – funciona de certo modo como a sentença de interdição ou como a instauração do respectivo processo, depois de devidamente publicada. Mas só de certo modo. Estabelece uma simples presunção refutável da existência do estado demencial no momento do negócio; mas não uma presunção irrefutável, isto é, uma certeza legal nesse sentido”.

    E a pag. 91, escrevia: “Não tendo valor definitivo, até porque a data provável do começo da demência é marcada apenas como provável, parece, no entanto, que constituirá presunção que dispensará a prova de demência por parte do que a alega, comportando embora prova em contrário. A não ser este valor, não se vê que outro pudesse competir-lhe, e não deve supor-se que a lei tenha formulado uma exigência inútil”.

    No mesmo sentido opinava o Prof. Mota Pinto, in “Teoria Geral do Direito Civil”, 1973, a pgs. 454/455, onde escreveu: “A anulabilidade (dos negócios jurídicos levados a cabo pelos interditos anteriormente à publicidade da acção) tem, como condições necessárias e suficientes, os seguintes requisitos: 1) que, no momento do acto, haja uma incapacidade de entender o sentido da declaração negocial ou falte o livre exercício da vontade; 2) que a incapacidade natural existente seja notória ou conhecida do declaratário (contraparte nos contratos, destinatário da declaração nos negócios unilaterais receptícios, destinatário dos efeitos da declaração nos negócios unilaterais não receptícios)…O nº 2 do artº 257º esclarece que notório é um facto que uma pessoa de normal diligência teria podido notar… Para a anulabilidade destes actos não basta a prova da incapacidade natural, exige-se igualmente, para tutela da boa fé do declaratário e da segurança jurídica, a prova da cognoscibilidade da incapacidade”.

    Ainda a este propósito, o Prof. Castro Mendes, in “Teoria Geral”, 1978, vol. I, pg.. 341/359, também defendia que “do artº 257º do CC resulta que o acto é anulável se a incapacidade era notória – no sentido de manifesta a uma pessoa de normal inteligência – ou conhecida da outra parte. Se a contraparte não conhecia a incapacidade nem se devia ter apercebido dela, o acto é válido... Se um maior demente, não interditado nem inabilitado, vende um objecto a outra pessoa, há que ver se ele no momento do acto estava lúcido ou não. Se estava, o acto é válido; se não estava: a) ou o comprador sabia que o vendedor não estava lúcido, ou, então, dever-se-ía ter apercebido dessa circunstância e, nestes dois casos, o acto é anulável; b) ou o comprador não sabia nem tinha que saber que o vendedor não estava lúcido e, então, o acto é válido. A anulabilidade está sujeita às regras gerais do artº 287º”.

    Na jurisprudência, a propósito da interpretação e da aplicação do artº 257º do C. Civ., entre outros, podem ver-se os Ac.s STJ de 21/03/1995 e de 5/07/2001, respectivamente in C. J. STJ 1995, tomo I, pg. 130, e C.J. STJ 2001, tomo II, pg. 151, onde se escrevem as seguintes passagens: “A declaração negocial feita por quem, devido a qualquer causa, se encontrava acidentalmente incapacitado de entender o sentido dela ou não tinha o livre exercício da sua vontade, desde que o facto seja notório ou do conhecimento de declaratário é anulável.
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