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      FD
    • 8 dezembro 2006

     # 1

    O sonho de casa nova, em muitos casos, dura apenas alguns meses. Inaugurada a moradia, gastos os milhares de euros em materiais e construção, mais cedo do que se desejaria, surgem as primeiras rachas e infiltrações que significam muitas chatices e o despender de mais dinheiro. Só até Outubro passado, o número de queixas relacionadas com defeitos de fabrico vai em 733. Para os consumidores há duas saídas os tribunais ou o assumir do conserto.

    Às sete delegações que a Deco, Associação de Defesa do Consumidor, tem em Portugal Continental, as denúncias relacionadas com construções ou empreitadas apontam como reclamações mais frequentes os defeitos de origem (como as humidades, os azulejos partidos ou as portas e janelas empenadas) e ainda os defeitos na prestação do serviço e incumprimentos contratual.

    Também a Associação Portuguesa de Consumidores de Portugal recebeu, em 2005, cerca de 30 reclamações por defeito de construção e consequente não assumpção da garantia de cinco anos, estabelecida pelo decreto-lei n.º 67/2003 (ver caixilho ao lado), e vai já em igual número no decorrer do ano prestes a findar. Segundo Teresa Madeira, "uma parte das denúncias" consegue resolver-se extrajudicialmente, através da mediação, mas há ainda muitos casos que obrigam o consumidor a recorrer aos tribunais.

    O desespero de Isabel...

    Saiu de Portugal com o sonho de construir casa própria e passados 13 anos conseguiu-o, ainda que esta sirva apenas para as merecidas férias, na terra natal, Monsarros, Anadia, de uma vida de trabalho emigrante nos Estados Unidos da América.

    Em 2000, Isabel Esteves e o marido iniciaram a casa há muito idealizada - cave, três quartos, escritório, cozinha, sala e quatro banhos, tudo o que gostou e pôde agora comprar.

    O contrato com o empreiteiro era simples 102 500 euros por um trabalho "chave na mão", até porque o facto de ser emigrante assim o exigia: Isabel não podia acompanhar a par e passo a obra.

    Os primeiros sinais de que algo na obra não correra bem surgiram nas paredes a tinta descascou, a humidade infiltrou-se, a parede apareceu "podre", apenas três ou quatro meses após o final da construção, já no Verão de 2001. O empreiteiro não assumiu a reparação e o caso está em tribunal há três anos e meio.

    ... e a história de Madalena

    Como o de Isabel Esteves haverá centenas casos pelo país fora.

    Madalena Monteiro protagoniza um caso semelhante. Concluída a casa em Maio de 2003, foi em Setembro desse mesmo ano que as primeiras rachas começaram a abrir. Alguns meses depois, todo o soalho da casa empenou, descolou e chegou mesmo a partir.

    Madalena e Carlos Abrantes chamaram o empreiteiro a assumir a responsabilidade que lhe competeria, mas a resposta deste foi sempre que "a obra estava concluída e não havia mais nada a fazer".

    Depois de várias tentativas sem quaisquer resultados, o casal decidiu resolver por si próprio o problema e prepara-se para iniciar obras de reparação numa casa nova. "Vamos para tribunal para quê? Para estarmos anos e anos à espera? Com o dinheiro que ia gastar em advogados, faço as obras todas que tenho que fazer e resolvo o assunto", explica Carlos Abrantes.

    De facto, o caso de Isabel Esteves deu entrada no Tribunal de Anadia em Junho de 2003 e, entre exames periciais e outras diligências, continua à espera de ser julgado.

    Em quase todos os casos há um denominador comum a dificuldade que accionar a garantia do imóvel, conferida por lei. Segundo Graça Cabral, da Deco, a taxa de sucesso da mediação no sector da construção civil continua, como há anos, muito atrás da média de 80 % conseguida na maioria dos sectores geradores de conflitos entre consumidores e vendedores/prestadores de serviços.

    "A mediação na construção civil não é obrigatória, por isso há muitos construtores que não a aceitam e obrigam os consumidores a recorrer ao tribunal para verem reconhecidos os seus direitos", explica.

    Aos consumidores, Graça Cabral esclarece que o primeiro passo terá sempre que ser a formalização da reclamação por escrito. "Muitas vezes as pessoas fazem diligências orais junto do construtor ou empreiteiro, mas esta via não confere a formalização da reclamação. Isto só acontece quando a reclamação é feita em carta registada dirigida à entidade reclamada".

    Legislação dá ao consumidor direito a exigir reparação

    A lei portuguesa é bem clara quanto aos direitos dos consumidores e às responsabilidades de quem constrói. Segundo o n.º 1 do artigo 3.º do decreto-lei 67/2003, de 8 de Abril, "o vendedor responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue", acrescentando o n.º 2 que "as faltas de conformidade que se manifestem num prazo de dois ou de cinco anos a contar da data de entrega de coisa móvel corpórea ou de coisa imóvel, respectivamente, presumem-se existentes já nessa data, salvo quando tal for incompatível com a natureza da coisa ou com as características da falta de conformidade".

    No n.º 1 do artigo 4.º, o decreto-lei refere que "em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato". No n.º2 do mesmo artigo pode ler-se que "a reparação ou substituição devem ser realizadas dentro de um prazo razoável, e sem grave inconveniente para o consumidor, tendo em conta a natureza do bem e o fim a que o consumidor o destina".

    Quanto a prazos, o disposto no n.º 1 do artigo 5.º do mesmo decreto-lei é bem claro "O comprador pode exercer os direitos previstos no artigo anterior quando a falta de conformidade se manifestar dentro de um prazo de dois ou cinco anos a contar da entrega do bem, consoante se trate, respectivamente, de coisa móvel ou imóvel.

    Diz a experiência, no entanto, que são poucos os empreiteiros que reconhecem ou respeitam o referido decreto-lei sem que sejam obrigados a isso em tribunal.

    http://jn.sapo.pt/2006/12/04/primeiro_plano/casa_novas_defeitos.html
 
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