Colocado por: MercedesPor respeito aos demais foristas:
Não é possível compreender a incrível inflação do imobiliário após a crise de 2008 sem constatar que houve uma alteração na composição da procura por habitação (ou imobiliário, em geral) em Portugal, apoiada num redireccionamento dos investimentos dos fundos mobiliários. Isso é perfeitamete percetível no gráfico que partilhei, mesmo não sendo o forista experiente em leitura de estatísticas, basta perceber a alteração das manchas de cores para compreender que o imobiliário passou a ser o principal mercado dos fundos de investimento em PT, em detrimento de outros ativos, como ações ou obrigações. Até 2007, a composição do stock de unidades de participação era maioritariamente de obrigações; apesar de haver um crescimento de unidades de participação em fundos de ativos imobiliários, o stock agregado de unidades de participação era diminuto. A partir de 2008 e com a crise do sistema financeiro os fundos redireccionaram a sua procura para ativos imobiliários, muito mais seguros e menos permeáveis à perda de valor a que estão sujeitos os ativos financeiros típicos, alterando aquela composição do início dos anos 2000. O stock dos fundos imobiliários era de quase 4 mil milhões em 2000, o de obrigações era de quase 16 mil milhões. Em 2007, o stock de obrigações era menos de 7 mil milhoes e o de ativos imobiliários ultrapassava os 13 mil milhões, mantendo-se estável até durante a pandemia (com uma descida pequena, na ordem dos 3 mil milhões) e estando outra vez em clara trajetória ascendente desde 2020. Em 2024, esse stock de ativos imobiliários detido por fundos já estava nos quase 18 mil milhões.
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Como se percebe isto na prática e na vida de todos os dias? É fácil: experimentem ir negociar a compra de um imóvel em construção, e vejam lá as opções que têm. O mais provável, é que vos sugiram uma unidade de participação (num fundo de investimento), que compram por uma % do valor a que o imóvel está a ser transacionado, e que depois podem decidir ou vender - a um valor superior - ou reter e pagar o resto do valor integral da casa. Se procurarem alugar uma casa em Lisboa, é muito mais provável, também, que esta seja detida por um fundo, e que seja uma unidade de gestão ou consultora imobiliária a representar o fundo na celebração e gestão contratual.
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Se alguém quiser ouvir sobre isto, há um podcast interessante participado por investigadores que se dedicam ao estudo da habitação e do mercado imobiliário, o Pedalada (https://www.youtube.com/watch?v=tEQFgxbEBVU). É malta de esquerda, claro está, que a direita não fala desta coisas. E para os que apregoam que eu vendo a cassete do BE, declaro já que não sou do BE, não voto nem milito nesse partido. Não me escuso, todavia, de dar razão a quem a tem, quando a tem, de tal maneira que reconheço e debato méritos de política pública mesmo quando são partidos de direita (assumida ou disfarçada, caso do PS) a apresentá-los - como, aliás, fiz lá atrás a propósito de umas iniciativas do PS.<
Colocado por: luisvv
Os Organismos Alternativos de Investimento têm uma influência muito menor do que o sugerido. Se acha que 6% do total da carteira deles mexe significativamente o mercado..
Colocado por: MercedesQuando é que, na história do imobiliário ou só da habitação em PT, se praticou uma coisa destas? Que eu saiba, nunca. Mas se estiver enganada, elucidem-me.
Colocado por: dmanteigas
Alem de que o exemplo da minha rua, nao e o exemplo do Pais, e mais uma vez agora saimos dos fundos para o Ze Manel que tem uns trocos e comprou um apartamento para revender e fazer dinheiro na cedencia de posicao.
Num proximo capitulo a Mercedes vai descobrir as permutas e ai e que vai ficar chocada...
Colocado por: Mercedesá o Dmanteigas não tem feito outra coisa senão importunar-me a mim e aos outros foristas.
Colocado por: MercedesE não sou eu, aqui, o objeto do debate, caramba. Que fixação é essa com a minha pessoa?
Colocado por: MercedesE isto não é um fenómeno exclusivo de Lisboa, como disseram. Ainda esta semana me ofereceram uma transação de um CPCV por não sei quantos por cento do preço do imóvel em construção, em gaia e junto à A1 - a casa ainda não está concluída e aqueles CPCV já foram transacionados não sei quantas vezes, em pura especulação. Se eu quisesse ganhar dinheiro com aquilo, comprava e voltava a vender por uma % acima.
Quando é que, na história do imobiliário ou só da habitação em PT, se praticou uma coisa destas? Que eu saiba, nunca. Mas se estiver enganada, elucidem-me. No mesmo empreendimento onde fui ver, um amigo comprou um T2 com 80m2 em construção por 200 mil euros. À custa desta forma de especular sobre os preços de venda e de transacionar unidades de participação (sob a forma de CPCV ou lá o que for), os mesmos T2 no prédio ao lado já estão nos 300 e tal mil euros - num espaço de menos de 2 anos.
Colocado por: Mercedes
Acho que têm muita influência na formação do preço, sem dúvida. É certo que há outros fatores, e não devem ser descurados, mas para mim, para além dos mecanismos de investimento financeiro no imobiliário, não há nada que explique melhor a inelasticidade da tendencia de preços. Era essa a pergunta inicial, mais ou menos isto: qual será a tendência no mercado de habitação com a nova configuração parlamentar? A minha resposta foi que, impossibilitados de regular esse afluxo de investimento, dificilmente os preços desceriam.
A minha resposta - para lá de todas os ruídos introduzidos por outro forista, que nem sequer deu uma resposta cabal à pergunta inicial - foi a de que a tendência geral de aumentos de preços não pode ser compreendida descurando a transformação do imobiliário num ativo transacionável internacionalmente, o que transforma a procura, deixando esta de estar ancorada num mercado que é quase exclusivamente composto por residentes.
Em alternativa, poderíamos considerar as outras variáveis relevantes. 1, um aumento geral de salários reais, que é uma ficção total, os salários reais estão em sucessivas flutuações de perda e estagnação desde a crise e da troika e essa tese é completamente desprovida de realidade. 2, um aumento geral de preços de matéria-prima - isso é certo, sobretudo desde a pandemia e com a reconfiguração de algumas cadeias de produção, mas os preços da habitação estão a aumentar significativamente desde 2013, quando as taxas de variação homologa no Indice de Preços da Habitação atingiu os 5% após ter estado negativa em 8,3 pontos no verão de 2012. Não faz sentido advogar que, em 2013, com uma crise socioeconomica como a que tínhamos na altura, uma alegada "recuperação económica e de rendimentos" justificava aquela variação tão estrondosa, de -8,3% em 2012 para 5% um ano depois.
3, o crédito - nessa altura, a banca estava em recessão, a despachar os imóveis (habitação e de comércio e indústria), que particulares e empresas lhes tinham entregado, despachando ao preço da dívida ou abaixo disso) em leilões sucessivos para evitar um efeito bola de neve sobre o crédito malparado. A concessão de crédito recomeçou uma trajetória mais sustentada sobretudo após as medidas macroprudenciais do Banco de Portugal, que são de 2017 e reagentes a uma ligeira subida na procura de crédito incentivada pela reposição de algum rendimento nominal no período da gerigonça. Ainda assim, olhando para os dados disponíveis, essa recuperação não tem força explicativa do fenómeno.
Para mim, duas coisas principais: a. a inelasticidade da procura residente agregada, já que as pessoas não cessam de precisar de casa e de teto mesmo que os preços aumentem (mas esta é uma explicação de "chapa sete", toda a gente sabe que a habitação tem uma procura não elástica, a procura só desce quando há uma catástrofe económica e social como a do período 2011-2013) e, b. essa sim diferente, a inelasticidade das novas procuras, que são as causadas pela entrada de capital financeiro no setor do imobiliário.
Isto não significa que o investimento institucional adquire a maior fatia do imobiliário, significa que opera de maneira que mantém os preços elevados de forma agregada, incentivando a construção de luxo, a transação de unidades de participação sobre imóveis de qualidade mediana, e contagiando a formação de geral dos preços e de operações correntes de compra e venda, já que estas são moldadas num jogo de avaliações formais e informais sobre os preços e práticas de venda efetiva. Claro que, nesta dinâmica, os imóveis adquiridos a dois dígitos nas dezenas de milhar nos anos 90 saem agora por 200 ou 300 ou 400k, porque o preços são compostos com base na avaliação das vendas anteriores e, nessas, cabe tudo o que é vendido, desde a maior espelunca ao imóvel de vários milhões. O preço médio/mediano das vendas não deixa o valor dos imóveis descerem para um valor real. É um efeito de contágio que é suportado pela alteração das dinâmicas do mercado.
E isto não é um fenómeno exclusivo de Lisboa, como disseram. Ainda esta semana me ofereceram uma transação de um CPCV por não sei quantos por cento do preço do imóvel em construção, em gaia e junto à A1 - a casa ainda não está concluída e aqueles CPCV já foram transacionados não sei quantas vezes, em pura especulação. Se eu quisesse ganhar dinheiro com aquilo, comprava e voltava a vender por uma % acima.
Quando é que, na história do imobiliário ou só da habitação em PT, se praticou uma coisa destas? Que eu saiba, nunca. Mas se estiver enganada, elucidem-me. No mesmo empreendimento onde fui ver, um amigo comprou um T2 com 80m2 em construção por 200 mil euros. À custa desta forma de especular sobre os preços de venda e de transacionar unidades de participação (sob a forma de CPCV ou lá o que for), os mesmos T2 no prédio ao lado já estão nos 300 e tal mil euros - num espaço de menos de 2 anos.
Colocado por: vmontalvao
Isso é tão normal, que não sei como é que lhe passou ao lado. O normal é que desde que se pague o valor em planta até ao dia da escritura, o apartamento já tenha valorizado pelo menos 50%.
Hoje em dia, já há contratos que não permitem a cedência de posição, mas a maioria permite-o.
Colocado por: luisvv
Os imóveis para habitação na posse de OAI corresponderão grosso modo, arredondado generosamente para cima, a 1000 milhões de euros.
Em 2024 transacionaram-se 30 mil milhões. Ligar um stock acumulado que corresponde a menos de 3% do volume transacionado num ano é esticar a corda a um nível impossível.
Ao contrário do que se supõe, os fundos tendem a regular preços. Buscam rendibilidades mas estão sujeitos a tensões entre valorização e liquidez, o que obriga a colocar imóveis no mercado, se necessário abaixo de preço de mercado.
É estender o gráfico para trás, até 2007, e esse efeito esbate-se.
Taxas de juro historicamente baixas (e até negativas) anos a fio, liquidez a rodos, simples.
A avaliação não é feita assim. Antes de mais, o fim da avaliação determina quem e como avalia, e qual o conceito de valor a utilizar - e se para um crédito é admissível uma avaliação chapa 4, ainda assim os valores a considerar são de imóveis comparáveis (e se não houver comparáveis, usam-se factores de homogeneização).
Para fundos, os requisitos são bem mais apertados.
Promotores que se financiam com capital alheio, nada de novo. Se há múltiplas transações, é um promotor burro, que deixa dinheiro em cima da mesa. Dependendo das taxas de actualização usadas, pode ser um bom negócio para promotor e comprador, mas de 200 para 300 só um burro.
O essencial no entanto é: os fundos pesam perto de zero, os não residentes pesam pouco e vão geralmente para segmentos de preço superior, que não existiriam com os nacionais.
Sobram ainda outros factores: alteração das relações familiares, com profundo impacto na composição dos agregados: entre 2011 e 2021 o nº de agregados familiares aumentou 120.000.
A emigração também é um factor, e muito relevante nos últimos anos - cria uma pressão nos preços do arrendamento, por exemplo.
E haverá outros, menos sexy que "os fundos" e a "financeirização".
Colocado por: MercedesMas é normal desde quando? Pergunta genuína, há mesmo muita coisa que me passa ao lado, como a qualquer outra pessoa.
Colocado por: MercedesO histórico das suas respostas.
Colocado por: vmontalvaoIsso é tão normal, que não sei como é que lhe passou ao lado. O normal é que desde que se pague o valor em planta até ao dia da escritura, o apartamento já tenha valorizado pelo menos 50%.
Hoje em dia, já há contratos que não permitem a cedência de posição, mas a maioria permite-o.
Colocado por: MercedesÉ que até poderia ser uma prática comum entre um nicho, de investidores particulares e empresariais, mas não era a maneira comum de abordar um potencial comprador final.