Colocado por: Fernando Gabrielpor falar em urgências...a taxa cobrada de quem tem seguros nas urgências subiu e muito, ou é impressão minha?
eu antes pagava 10€ agora são 35€ no meu actual contrato
Como a ADSE está a 'matar' os hospitais públicos
Os hospitais públicos estão a perder "clientela" para o setor privado, com a ajuda do próprio Estado, através do subsistema de saúde da Função Pública, que atravessa uma fase conturbada
Os dados observados são rigorosos, comparáveis e reveladores: durante o primeiro trimestre deste ano, o recurso às urgências dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) sofreu uma quebra da ordem dos 6,7%, apesar do pico de procura provocado pelo surto de gripe, enquanto a procura do mesmo tipo de serviço, no setor privado, aumentou 15%, quando comparado com o mesmo período do ano anterior.
Se o crescimento de dois dígitos das urgências privadas é ou não uma consequência direta do aumento das taxas moderadoras em vigor desde janeiro, com os utentes do SNS a pagarem 20 euros pela urgência em vez dos 9,6 euros que antes lhes eram cobrados, é uma questão à qual caberá aos peritos dar uma resposta cabal.
Mas quem está no terreno tem, para já, a perceção empírica de que aquela mudança na política de saúde não terá sido totalmente alheia ao novo contexto. E que a transferência de "clientes" do público para o privado se verifica, sobretudo, ao nível dos funcionários públicos e das suas famílias, que totalizam os 1,3 milhões de beneficiários da Proteção Social aos Funcionários e Agentes da Administração Pública (ADSE), os quais, de uma maneira geral, podem usufruir de cuidados de saúde mais baratos no privado do que no público. É que, naquele setor, uma consulta de especialidade custa-lhes €3,99, enquanto, no sistema público, teriam de pagar uma taxa moderadora de €7,5 e sujeitar-se a listas de espera de cinco meses.
Para o presidente da Associação Portuguesa de Hospitalização Privada, Teófilo Leite, não há dúvidas: atualmente, um utente da ADSE paga menos por uma consulta num hospital privado do que num público. Uma constatação que facilmente pode ser corroborada, consultando as tabelas da ADSE. Este, bem como outros subsistemas públicos, como os das Forças Armadas, GNR e PSP, proporciona aos seus beneficiários um esquema de comparticipações nos cuidados de saúde privados que o presidente do conselho de administração do Hospital de São João do Porto, António Ferreira, equipara a um seguro de saúde "topo de gama" e o leva a dizer que se trata de uma forma de o Estado financiar os privados. Teófilo Leite estima que as transferências anuais da ADSE para a hospitais privados andarão à volta dos 200 milhões de euros, cerca de um sexto do volume de negócios do setor.
Com efeito, no seu orçamento de 2011 (os dados públicos mais recentes), a ADSE previa gastos de 233 milhões de euros com o regime convencionado - isto é, para pagar a organizações de saúde privadas com as quais tem acordos -, mais 156 milhões para financiar o recurso dos beneficiários ao chamado regime livre - aquele em que não há acordo, mas em que o utente, apresentando uma fatura, é reembolsado, em parte, pela despesa que efetuou. Feitas as contas, 389 milhões de euros terão fluído dos cofres do organismo tutelado pelas Finanças para o setor privado, mais 7,8% do que um ano antes.
Declarações de António Ferreira, proferidas há cerca de um mês, em Fátima, no âmbito da pastoral da Saúde, ecoaram pela paisagem mediática. Desassombrado, falou de uma instituição - a ADSE - imune à crise, que não é extinta, apesar das recomendações da troika, porque quem manda é a "endogamia e os interesses privados".
O sentimento é similar entre gestores e clínicos do SNS. Por um lado, os hospitais públicos estão sujeitos a medidas draconianas de poupança forçada, que nem as ligaduras e compressas deixam de fora, sendo-lhes imposta uma redução de 200 milhões de euros. Por outro, estão a ver o próprio Estado, através da ADSE (e de outros subsistemas), a contratualizar com privados.
Lamento discordar, mas não há nenhuma razão de fundo que justifique a existência da ADSE. A menos que se extinga o SNS e se opte pela liberdade de escolha para todos os cidadãos.
Desde logo, não deixa de ser estranho que o Estado tenha criado um Serviço Nacional de Saúde para os cidadãos em geral, considerando que esta é a melhor forma de prestar cuidados de saúde a todos os cidadãos, e em 1979 tenha mantido a ADSE para os seus funcionários, que facilita e promove a medicalização privada dos funcionários públicos.
Depois, ao contrário do que é a convicção dos próprios funcionários públicos, a ADSE não é coberta pelas contribuições e descontos: a ADSE, no Orçamento do Estado, representa uma despesa directa de cerca de mil milhões de euros. Este, porém, não é o impacto total da ADSE nos cofres do Estado, já que grande parte dos cuidados de saúde que são prestados aos funcionários das empresas públicas afectos à ADSE são da responsabilidade da própria empresa pública. Isto é, os descontos efectuados pelos funcionários são transferidos para ADSE; a ADSE, a partir de 2011, passa a ter como receita ainda 2,5% do salário do trabalhador; ocorre, porém, que as despesas privadas dos funcionários são da responsabilidade da entidade patronal. Ora, somando as despesas globais da ADSE o défice total deverá atingir um valor próximo dos 2 mil milhões de euros.
A extinção da ADSE traduzir-se-ia não só numa poupança significativa para os cofres do Estado, como representaria além disso uma medida de equidade e moralização do sistema, pois não faz sentido que o Estado reserve um sistema de saúde para os cidadãos – o SNS – e um subsistema paralelo, mais benéfico, para (alguns) (d)os seus funcionários – a ADSE.
A ADSE totalizava, em 2009, 1,3 M de beneficiários. E tem uma relação custo-benefício superior a qualquer seguro privado. Tem, por exemplo, um custo inferior e uma cobertura superior ao melhor seguro de saúde oferecido pela Medis. À custa do contribuinte.
Não defendo a extinção da ADSE apenas por questões de mera eficiência ou poupança para os cofres do Estado. De facto, e quando dou nota que a contribuição dos cofres públicos ascende a, aproximadamente, dois mil milhões de euros, não estou com isso a afirmar que a poupança com a extinção do SNS seria da mesma ordem. Na verdade, parte destes gastos traduzir-se-iam em despesa no SNS; o maior impacto, contudo, duma medida destas ocorreria ao nível dos prestadores de serviços privados que são hoje financiados pela ADSE, em muitas situações, correspondendo a gastos pouco justificados e fraudulentos. Mas, no fim, não é só o custo que me motiva a defender a morte da ADSE.
As razões pelas quais me oponho à ADSE são de ordem moral e política.
Desde logo, há uma crítica moral, porque a forma como está montada a ADSE favorece – e muito – o desperdício de recursos e a fraude. Moral, também, porque cria inequidades, entre os funcionários públicos que têm acesso a um sistema de saúde amplo e recheado de regalias, e os restantes cidadãos (muitos deles com vínculo ao Estado ao abrigo de contrato individual de trabalho) que pagam impostos e recebem em troca o acesso ao SNS. Finalmente, moral, porque a ADSE representa um benefício para alguns, que é pago na sua grande medida por todos os contribuintes.
A crítica é ainda política, porque a existência da ADSE cria um incentivo errado, de que “o que era bom” era, não um SNS, mas uma “ADSE para todos”. A ADSE seria o melhor modelo, porque permite amplo acesso à saúde, e promove a “liberdade de escolha”.
Importa perceber, desde já, que a liberdade de escolha é uma solução interessante, mas só porque o quadro de partida é o de um SNS estatizante. A liberdade de escolha é a fórmula política que se pode usar para introduzir mais liberdade e eficiência na prestação de cuidados de saúde, e num quadro de paridade entre público e privado. Mas atenção, a solução, em si, tem inúmeras fragilidades: desde logo, porque estamos ainda num quadro em que, sendo o financiamento estatal, ou seja, via impostos, a tendência para capturar recursos, e fomentar o desperdício e a fraude, permanecem. E, neste quadro, a ADSE é um abcesso. Não dá para a reformar e adequar, para a transformar num sistema universal.
Voltando ao fenómeno “custo”, e para além dos vícios e maus hábitos acumulados, das dificuldades de controle e das fraudes, pura e simplesmente a ADSE é tão cara para os contribuintes que nenhum Estado estaria disponível - nem mesmo os mais ricos - a oferecer um sistema destes à generalidade da população. Mais, nenhuma companhia de seguros oferece ou algum dia ofereceria uma cobertura semelhante à ADSE.
É bom que todos tenhamos consciência que as nossas finanças públicas, e perante o crescimento das despesas com saúde, não comportam um financiamento público com a extensão actual, quer do SNS, quanto mais da ADSE. Num futuro muito próximo, o Estado irá limitar os serviços que presta, e cada um de nós será forçado a pagar, do seu bolso, o que não estiver coberto pelo seguro público.
Por isso, é bom que não embarquemos em megalomanias, nem em soluções milagrosas que olham para o custo para o erário público como se fosse um pequeno pormenor.
Esta discussão, muito interessante, sobre a ADSE, permitiu-me confirmar algo que já desde longa data a doutrina apresenta e a prática me haviam mostrado à saciedade.
Desde logo, que a maioria das pessoas, mesmo as supostamente mais informadas, está ideologicamente intoxicada na discussão de temas como este, raciocinando na ausência de elementos factuais: este é o terreno fértil para a demagogia dos políticos e para a manutenção de soluções bizarras no campo das políticas públicas, e um dos grandes obstáculos a que se promova qualquer mudança significativa em Portugal. É chocante ver o nível de erro nos pressupostos e a dificuldade em aceitar evidências, com argumentos no estilo “a minha colega da frente que manda umas facturas diz-me x“, ou, “a ADSE tem menos fraude que o SNS” (porque dá jeito dizer isso, ainda que não haja qualquer base para fazer uma afirmação destas). Estes, entre outros argumentos, apenas servem para provocar ruído, e não ajudam a qualquer esclarecimento.
Por exemplo, este último raciocínio apresentado abaixo, algures numa caixa de comentários, labora no erro, desde logo, que eu sou a favor de uma solução tipo SNS – o que não é verdade – e ignora que o nível de fraude na ADSE é comprovadamente chocante, porque o sistema incentiva a fraude, ao contrário do SNS, que não incentiva a fraude (no sentido estrito da palavra fraude), mas a corrupção e a ineficiência operativa. Cada uma das soluções é má, ADSE e SNS, mas por razões distintas. A forma como a discussão se desenrola dá origem a falsas barricadas – quem é “contra a ADSE”, é “a favor do SNS” – branqueando um sistema péssimo para a liberdade – a ADSE – só porque não se gosta de um outro sistema péssimo – o SNS. Resultado? Vermos gente liberal a defender bosta de boi, temperada com pimentos e molho de caril, como algo que até pode ser muito bom, só porque não gosta de **** de cão com temperos menos apurados.
Siga a Marinha. Nesta lógica dos incentivos, é impressionante a dificuldade que muita gente tem em perceber que um sistema com os incentivos errados não deve ser defendido por quem advoga os valores liberais, ainda que dinamize a economia privada. Os privados, com os incentivos errados, produzem resultados económicos que são inimigos da liberdade e da propriedade: sim, porque a ADSE dinamiza a economia privada, e a “liberdade de escolha”, à custa sobretudo dos impostos de todos. E sim, os impostos são limitações à liberdade individual, e ataques legais ao direito de propriedade. Ou não?
Por isso, quando todos pagam – e não é pouco (2.000 milhões de euros) – para que alguns – 1,3 milhões de pessoas – tenham um benefício (cada beneficiário recebe em média dos impostos dos portugueses, 1.500 euros), que é negado, quer a pessoas que se encontram em igualdade de circunstâncias (ou seja, os funcionários públicos que exercem as mesmas funções, mas com um vínculo laboral distinto), quer ao resto da população – a quem o Estado oferece generosamente um SNS que não quer para os seus funcionários mais dilectos; quando este sistema está amplamente dominado por ineficiências e maus hábitos de prescrição, que favorecem o desperdício e a fraude em larga escala; quando, finalmente, os benefícios sem equidade, o desperdício e a fraude são suportados por gente comum como eu, numa limitação da nossa liberdade individual e dos nossos direitos de propriedade; então a minha oposição é clara e sem rodriguinhos.
Eu sou intransigente na defesa da integridade dos direitos de propriedade, da liberdade individual, da igualdade de oportunidades, da (verdadeira) economia de mercado e da iniciativa privada, mas não contem comigo para içar bandeiras a favor da rapinagem e de economias assentes em esquemas, soluções milagrosas e fantásticas porque suportadas pelo dinheiro que é de todos.
Colocado por: gf2011Não precisa de se enervar nem escrever em CAPS, quero lá saber onde você vive
Colocado por: gf2011E era subirem é já de imediato o preço a pagar mensalmente